segunda-feira, 26 de maio de 2008

SOBRE CUPINS, HERÓIS E ESCOLHAS.

Gostaria de começar este texto com um pouco de cultura inútil e bastante drama, a filosofia eu deixo para você, estimado leitor, procurar nas entrelinhas...
Você sabia que os cupins africanos constroem cupinzeiros enormes ( alguns com vários metros de altura ) e duros feito pedra para os protegerem, já que seus corpos são desprovidos da couraça de quitina típica de outros tipos de insetos?
Você sabia que os elefantes africanos adoram coçar seus flancos em cupinzeiros enormes feitas por cupins que têm o corpo mole por não ter couraça de quitina?
Chega de cultura inútil e vamos para a parte dramática: Quando os cupinzeiros são destruídos pelos elefantes, os cupins-operários se põem imediatamente a reconstruir sua fortaleza enquanto um grupo de cupins-soldados protege a colônia de seus invasores, geralmente formigas muito mais fortes e protegidas com sua carapaça de quitina, dos quais os pobres cupins-soldados não têm a mínima chance. A única coisa a se fazer é grudar nas formigas, para desacelerar o avanço, enquanto elas despedaçam os pobres e moles soldados...
Enquanto isso, as operárias trabalham para fechar o cupinzeiro, e quando o fazem, fecham os cupins-soldados para fora com o inimigo! Ou seja, os cupins-soldados saem para a morte certa para a defesa incerta de seu cupinzeiro.
Homero nos conta em seu épico Ilíada a batalha de Tróia e tem um trecho em especial que eu gostaria de destacar – A espera obstinada de Heitor pelo enfurecido Aquiles.
Heitor sabia que Aquiles era muito mais forte e que se corpo era indestrutível, tinha armas melhores, era mais veloz, muito bem treinado e vinha com toda sede de vingança.
Heitor esperava do lado de fora das muralhas de Tróia, esperava sabendo que ia morrer mas esperava no intento de defender sua família, sua cidade. Qual é a diferença entre Heitor e os cupins-soldados? Ele é mais valente? Por que ninguém faz filmes sobre os pobres cupins? Será que Eric Bana aceitaria fazer o papel de um cupim ao invés de Heitor em “Tróia”? Já pensaram em Brad Pitt fazendo o papel de um formigão?
As formigas, os cupins e todos os outros animais agem pela forma que agem por serem prioritariamente guiados pelo instinto. O que levou Heitor a enfrentar Aquiles foi uma escolha.
Heitor podia fugir, fingir de louco, acovardar-se e tantas outras opções, todas levam a um absoluto: a capacidade de escolher.
O heroísmo de Heitor está ligado a sua escolha. O relativismo absoluto é incoerente filosoficamente pois, de forma inata, temos o absoluto da escolha. Mesmo a omissão é a escolha de deixar outrem escolher em seu lugar!
Para sermos agentes morais temos que ter a capacidade de escolher de forma livre, responsável e conscientemente baseados em valores de bem e mal.
O querido leitor já deve saber onde quero chegar e já se prontificou a questionar: “ O bem e o mal não são valores relativos? O que é bom para mim, talvez não seja bom para você...” o qual devo me adiantar e discordar do nobre colega. A ênfase dada a certo valor pode ser maior ou menor sem torná-lo relativo. Em uma dada sociedade “bom” pode ser ter um cacique, já na outra “bom” é escolher um líder de forma democrática – mas os dois têm o conceito de Bem como forma universal. Aliás, o bem em seu sentido universal, segundo Aristóteles, é a busca final da ética. Escolhas que colaboram para o Bem são escolhas moralmente aprováveis.
A base filosófica na qual fundamentamos nossas escolhas são imprescindíveis para determinar a moralidade da mesma. Quanto mais elevada a “filosofia de vida” que você adotar, mais moralmente aceitáveis e mais voltadas para o bem serão suas escolhas.
Um pouco de cultura inútil, um pouco de drama, mas a parte filosófica deixarei para você, aí do outro lado, responder: Qual é a base moral das suas escolhas?

sábado, 3 de maio de 2008

TUDO É RELATIVO!!!

-” Tudo é relativo!” Exclamou vitorioso o aluno ao terminar de expor sua brilhante idéia acerca da relatividade no mundo da moral.
Naquele momento sorri, pensei em como aquela idéia apresentada pelo meu estimado aluno não era em nada nova (apesar dele ter achado que era inovadora sua resposta ) mas sim de um pensador chamado Augusto Comte ( 1798 – 1857) e como a sua influência através do tempo tinha viajado até aquela terça-feira chuvosa .
Comte, filósofo francês, fundou a sociologia científica, além de cunhar o termo “sociologia” também pretendia estabelecer uma moral científica, mas faleceu antes disso.
Segundo próprio Comte:” ...Para esse fim, minha filha, deveis renunciar, em primeiro lugar, a toda pretensão de unidade absoluta, exterior, em uma palavra, objetiva; o que vos será mais fácil do que a nossos doutores. Semelhante aspiração, compatível com a pesquisa das causas, torna-se contraditória com o estudo das leis, isto é, das relações constantes apanhadas no meio de uma diversidade imensa. Essas não comportam senão uma unidade puramente relativa, humana, em uma palavra, subjetiva.”
Depois deste breve momento de reminiscência Comteana, tive que perguntar a meu querido aluno a pergunta que adoraria fazer a Comte:
- “Mas isso não seria um absoluto?”
A questão da relatividade tão em moda nos tempos atuais nos leva a uma falha filosófica , a questão da não-contradição. A não-contradição é a premissa de que um postulado não deve contradizer aquilo que se propõe dizer. Parece confuso? Eis um exemplo:
“Tudo é relativo.” Este postulado em si é um absoluto, ou seja, a partir deste dogma as coisas se tornam relativas...menos ela! Porém se eu afirmar que inclusive este dogma é relativo, então teremos que conviver com a relatividade da relatividade, que gera assim outra relatividade, que nos leva a um regresso infinito!
Saiamos desta esfera filosófica que deve estar te confundindo e vamos para um exemplo mais cotidiano. Lembro-me uma vez de assistir à aula de um professor na faculdade de história a convite de minha mãe. Depois de duas aulas expondo sua posição a favor de um “homem acima do bem e do mal” e de que a concepção de regras de conduta, principalmente a cristã, era um aprisionamento do super-homem contido em cada um de nós e depois de falar várias vezes que “Deus está morto”, fui até ele para tirar algumas dúvidas...
- “Deus está morto” e a idéia de übermensch ( homem que, livre das amarras morais cristãs, teria condições de a partir de seu próprio “eu” definir o que seria o bem e o mal, estando assim acima de qualquer conceito ético ) são idéias de Nietzsche, certo?
-Exatamente! Respondeu-me o caro colega.
- Nietzsche era, de certa forma, adepto da filosofia de Schopenhauer, certo? Perguntei.
- Muito bem. Respondeu-me novamente o professor.
- Então, já que segundo Nietzsche não há um Deus para me julgar e já que as condutas éticas partem do meu “eu” acima do bem e do mal, acho que tenho o dever de ir até a sua casa e matar a sua filhinha ( minha mãe tinha me dito que ele tinha uma bela garotinha com meses de vida ) pois segundo Schopenhauer toda vida é sofrimento e, segundo meu “eu” sua filha está viva, logo, sofre...
O professor me olhou por alguns segundos, e então me respondeu:
- Mas ai não...né?
Bom, notei que ele não era tão nietzschiniano assim...nem que seu relativismo era tão absoluto quando colocava sua filhinha em questão. Mas a verdade é que quando nossos direitos estão em risco deixamos de ser relativistas e gritamos a plenos pulmões regras, leis e normas para salvaguardar o que nos cabe. A idéia de relatividade pode até ser muito bonita no papel, mas para mantermos o mínimo de coerência existencial precisamos de regras de conduta hierarquicamente ordenadas para manter um pouco de ordem social. Basta lembrar que o ápice nietzschiniano relativista existencialista fora personificado na pessoa de Hitler...
Será que o holocausto foi relativo?