segunda-feira, 14 de abril de 2008

PROMETEU , VOCÊ E EU

Na mitologia grega encontramos o curioso relato do mito de Prometeu. Ele roubou o fogo dos deuses para entregá-lo aos seres humanos. Por isso, sofreu um castigo terrível: foi acorrentado a um rochedo para ter seu fígado comido por um pássaro. Como o fígado é um órgão com capacidades regenerativas seu castigo jamais chegava ao fim.
Você, caro leitor, que está lendo este texto e chegou até aqui se perguntando sobre o título do mesmo tem seus afazeres e ambições: trabalhar, estudar, planejar, fazer exercícios, cumprir com seus deveres cívicos, tirar carta de motorista, comprar um carro, ler, fazer, viver... E se tornar assim um cidadão mais funcional, mais civilizado.
Mas de que vale civilidade sem reflexão?
Este mito traz uma análise interessante para nós, agentes morais hipermodernos: Para os gregos o fogo era justamente a essência da formação da sociedade, simbolizando a luz do conhecimento. A partir do momento em que subjugamos o poder do fogo pudemos cozer, nos aquecer, nos proteger de bichos peçonhentos e então tivemos tempo para desenvolver um conceito de sociedade. Mas com esta facilidade, segundo os gregos, seríamos “castigados” também com um pássaro comendo nossas vísceras. Para os gregos o fígado era o centro da emoção ( o cérebro era um “ar condicionado” para manter nosso corpo com a temperatura certa e o coração seria o centro do entendimento – é por isso que em inglês memorizar até hoje é “to know by heart” – saber “de coração”).
A civilidade e a vida social intensa, principalmente como nos dias de hoje, nos “acorrenta” a tantas novidades e a tanto agir que simplesmente paramos de refletir – no termo radical da palavra – repensar, reconsiderar, perceber, que tanta artificialidade nos torna insensíveis.
Estamos como Prometeu, acorrentados e perdendo a capacidade de notar o próximo e até mesmo de sentir... Como explicar seres tão modernos e tão civilizados que são capazes de queimar um índio por brincadeira, de surrar uma mulher em um ponto de ônibus e dizer que achava que era “apenas uma prostituta”, espancar uma colega e filmar para depois colocar em um site de relacionamentos apenas para ter seus cinco minutos de fama, matar os próprios pais por dinheiro, arrastar uma criança e até mesmo atirar por uma janela uma pequenina indefesa e ainda assim assistir a tudo passivamente de nossas tevês?
Refletir é repensar, é rever um conceito através de um ângulo outro que o oferecido pela maioria. Em uma sociedade tão voltada para o hiperconsumismo me vem à mente Jesus dizendo: “Olhai os lírios dos campos”. Será que toda a minha vida corrida não tem me feito perder a capacidade de ver a beleza frágil de uma flor? O esplendor de sua pequenez e o perfume imaculado que só uma pequena e insignificante flor tem? Quando foi a última vez que olhei para as estrelas, que sentei sem ter que fazer algo a não ser apreciar a criação? Quando foi a última vez que notei a pessoa ao meu lado?
O tempo passa, o pássaro continua comendo nossas vísceras e, sem uma sociedade capaz de refletir sobre os pressupostos essenciais adequados, os lírios continuarão murchando sem percebermos...

terça-feira, 1 de abril de 2008

CULTURA E LINGUAGEM – O PORQUÊ DA LEITURA

A língua de um povo é um dos maiores instrumentos, se não for o maior, de formar e perpetuar a sua cultura, sua força e domínio como nação. No livro de Gênesis percebemos que para espalhar o povo da planície na terra de Sinear Deus não enviou nenhuma peste, nenhuma “maldição”, nenhuma doença, nem mesmo um político brasileiro – Ele fez algo mais drástico – confundiu as línguas e assim o povo se espalhou dali sobre toda a face da terra.
Alexandre o Grande usava um método infalível para impor sua conquista sobre os povos invadidos – levava a sua língua e através dela impunha a cultura de seu povo. Um povo que se comunica pela língua do povo conquistador mesmo livre será colônia, sempre pensará como conquistado e por natureza será um povo espalhado, não importa a beleza da planície em que se encontrarem.
Ao analisarmos o Brasil, notamos que estamos cada vez mais longe de sermos um país que pense por si só. Cada vez mais percebemos a total falta de habilidade de comunicação de nosso povo. O brasileiro tem dificuldade em escrever e beira o analfabetismo funcional ( é a falta de capacidade de interpretar um texto, mesmo conseguindo identificar os signos que formem o mesmo), segundo a pesquisa Retrato da Leitura no Brasil, da CBL, 61% dos brasileiros adultos alfabetizados têm muito pouco ou nenhum contato com os livros, O Brasil possui 1.500 livrarias (o ideal seria existirem 10 mil), 89% dos municípios brasileiros não possuem livrarias, Nos Estados Unidos, 30% dos livros editados são adquiridos pelos acervos públicos enquanto no Brasil somente 1% da produção editorial destina-se às bibliotecas, a aquisição de livros pelas bibliotecas norte-americanas é maior do que todo o consumo brasileiro – e percebam que estamos falando dos Estados Unidos – um país que não tem uma cultura voltada para o aprofundamento literário.
Um povo que não lê não tem fluência para escrever, para falar, para ordenar os pensamentos de forma lógica e nem confrontar de forma filosófica a sociedade em que está inserido, quanto mais ser agente de mudança. Não podemos exigir mais de nossos governantes enquanto não dermos um passo adiante e nos tornarmos defensores de nossa própria cultura. Nossa língua tem sido vilipendiada, quer por estrangeirismos desnecessários, quer por descaso dos falantes ou por arrogância de professores que transformam a língua em um código tão exclusivo que fazem os alunos odiarem a forma culta de se comunicar.
Desta forma andamos espalhados por esta terra do Brasil, sem o costume de leitura de qualidade, nossa língua vai se deteriorando, se tornando algo menor e cada vez com menos sentido, perdendo o seu valor e sua origem. Assim nos perdemos, como nossos irmãos de sina da terra de Sinear, lutando para edificar uma torre cujo cume toque o céu – mesmo não conseguindo ler a planta...